sábado, 30 de agosto de 2008

O despertar de Ana

Ana rompera a entrada da porta como quem anseia chegar primeiro. Alinhou-se em direção ao quarto, procurando a cama e não teve nem o cuidado de tirar os sapatos, cobriu-se em posição fetal. Cerrou os olhos como se quisesse encontrar outro mundo dentro deles.
O pavor tomara conta de seu ser como um todo. Tremia, a boca seca, o coração saltava no peito , sentia como se tivesse um tambor retumbando por dentro. Um calor lhe subia fazendo sentir a cabeça quente. Era como se a mente estivesse em revolução, querendo liberta-se do cérebro.
Não queria pensar no que estava acontecendo.
Nunca fora religiosa, mas naquele momento começou a rezar, achando que aqueles seriam seus últimos minutos.
Imaginou como seria a morte, logo descobriria o maior mistério da vida. Até que era excitante, desvendar o que se encontrava do "outro lado". Se é que este outro lado realmente existia. Claro que existia, pensou, não poderia simplesmente acabar, desaparecer no nada, não faria sentido.
A reflexão sobre sua própria vida fora inevitável, tinha um trabalho o qual gostava, Ana era professora, ensinava pessoas. Considerava sua ocupação nobre, porém sem a devida valorização. Os pais já haviam partido como ela costumava dizer. Era filha única, estava sozinha no mundo, fato esse, que freqüentemente a fazia perceber-se insignificante.
Aos 33 anos trazia cicatrizes na alma de vários relacionamentos, os quais a própria considerava fracassos. Talvez fosse melhor morrer mesmo, a vida não estava lá essas coisas.
Lembrou do longo caminho que percorrera até chegar em casa e ali se encontrar esperando sua hora, acolhida em seu ninho como se quisesse renascer.
Ana não tinha carro, contrariando a maioria, cujo sonho de consumo era um automóvel, ela gostava de andar de ônibus. Sentia-se segura, sendo guiada. Adorava ir olhando através janela, observar as pessoas. Nem o fato de ter que percorrer metade do caminho em pé, em função da grande quantidade de passageiros naquele horário, a perturbava.
Uma vez que morava longe do ponto, até chegar a sua parada, sobravam lugares das pessoas que iam desembarcando e Ana apreciava daquela troca.
Naquela manhã, entrara na lotação como de praxe o fazia após a aula e como se fosse um filme repetindo a mesma cena diariamente, não havia assentos vagos. Os passageiros iam se acomodando como podiam e a cada parada ia se tornado mais difícil encontrar espaço. Como era desagradável chegar tão perto de desconhecidos.
Apesar de tudo, de certa forma, naquele momento Ana sentia-se pertencente não mais tão só, até desembarcar e voltar a ser individual.
Em meio a uma confusão de sentimentos ali, apertada entre aquelas pessoas, Ana sentiu dificuldade de respirar como se de repente o ar não fosse suficiente para todos.
O coração acelerou como que querendo sair do peito e uma vontade de gritar a invadiu. Teve vontade de chorar como uma criança incomodada com a situação que se encontrava. Na sua luta interna, que cuidava para não trasnparecer e realmente não transparecia, olhava em volta e imaginava se dentro daqueles outros olhares haveria também outras revoluções submersas.
Foi quando pensou em descer, entretanto ainda estava longe de casa e naquela hora o que mais desejava era estar em seu refúgio, salva. Imaginou que se morresse demorariam a encontrá-la, pois morava sozinha, era melhor avisar alguém.
Tudo isso Ana relembrava como um filme em sua mente enquanto ainda rezava, apavorada, protegida por suas cobertas. Começou a prestar atenção na sua respiração, pois ouvira certa vez que respirar acalma.
A jovem mulher já esperava o pior, quando percebeu que lentamente tudo começara a voltar ao normal. O que teria acontecido? Lembrou de uma vizinha que comentara estar com "síndrome do pânico", seria essa a explicação? E se acontecesse novamente?
Estaria ela prisioneira do medo? O que de pior poderia acontecer? Se morresse já estaria morta mesmo, então não teria problema, pensou já sentindo uma certa serenidade.
Ana então deixou o casulo com dificuldade, tão quente e terno, mas uma vontade de viver a envolveu. De repente sentia-se forte como nunca, parte de um todo, não mais à parte. Embriagada de coragem, foi para rua com olhos de recém nascida e embarcou em outro ônibus lotado de rostos mascarados...
Débora Borsatti

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Imagens...

Tenho observado que nas festas ultimamente a moda é tirar fotos. As câmeras digitais se tornaram uma febre, até mesmo os telefones celulares tiram foto hoje em dia. Isso é realmente o máximo. Lembro que eu quando era criança precisava esperar uma semana para ver como haviam ficado as fotos., totalmente diferente do modo instantâneo atual, bateu, olhou, não gostou bateu de novo, olhou, não gostou, mais uma vez e por aí vai.
Já ouvi um filósofo falar que a tecnologia nos tornou impacientes, ou seja, no passado tínhamos que ter paciência para aguardar o resultado.
Penso ainda que antes das câmeras mesmo as mais antigas, eram os pintores que captavam as imagens e transportavam para as suas telas. Acho bem mais romântico...imaginem então o tempo que levava! Era muito mais fácil cultivar a virtude da paciência!
Deixo aqui hoje então uma pintura que eu particularmente acho linda de Renoir que se chama Le Moulin de la Galette
Imaginem a capacidade de observação e sensibilidade do olhar deste grande mestre do impressionismo!



Pierre-Auguste Renoir (nasceu em Limoges, 25 de fevereiro de 1841 e morreu em Cagnes-sur-Mer, 3 de dezembro de 1919) foi um dos mais célebres pintores franceses e um dos mais importantes nomes do movimento impressionista.
Desde o princípio sua obra foi influenciada pelo sensualismo e pela elegância do rococó, embora não faltasse um pouco da delicadeza de seu ofício anterior como decorador de porcelana. Seu principal objetivo, como ele próprio afirmava, era conseguir realizar uma obra agradável aos olhos. Apesar de sua técnica ser essencialmente impressionista, Renoir nunca deixou de dar importância à forma - de fato, teve um período de rebeldia diante das obras de seus amigos, no qual se voltou para uma pintura mais figurativa, evidente na longa série Banhistas. Mais tarde retomaria a plenitude da cor e recuperaria sua pincelada enérgica e ligeira, com motivos que lembram o mestre Ingres, por sua beleza e sensualidade.
A sua obra de maior impacto é Le Moulin de la Galette, em que conseguiu elaborar uma atmosfera de vivacidade e alegria à sombra refrescante de algumas árvores, aqui e ali intensamente azuis. Percebendo que traço firme e riqueza de colorido eram coisas incompatíveis, Renoir concentrou-se em combinar o que tinha aprendido sobre cor, durante seu período impressionista, com métodos tradicionais de aplicação de tinta. O resultado foi uma série de obras-primas bem no estilo Ticiano, assim como de Fragonard e Boucher, a quem ele admirava. Os trabalhos que Renoir incluiu em uma mostra individual de 70, organizada pelo marchand Paul Durand-Ruel, foram elogiados, e seu primeiro reconhecimento oficial veio quando o governo francês comprou Ao Piano, em 1892.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Pierre-auguste_renoir

Nós e nossa ânsia de captarmos nossa própria imagem como se isso fosse capaz de nos tornar imortais...

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Entre a paixão e o amor...

Houve um tempo que pensava que deveríamos nos apaixonar uma vez só na vida e nos mantermos sempre a apaixonados. Isso resolveria grande parte dos problemas da humanidade.
Quem pensaria em guerra estando apaixonado?
Quando estamos apaixonados não pensamos em dinheiro (já dizia Tim Maia).
A paixão nos faz ficar mais leves, despreocupados, portanto os índices de stress diminuiriam, reduzindo também um grande número de doenças.
Quando estamos apaixonados, não sentimos fome. Parece que estamos tão embevecidos daquele sentimento que nos esquecemos de comer, logo ninguém precisaria de dieta.
A paixão nos torna mais sensíveis, ficamos de bem com a vida, tudo se torna mais bonito, colorido. Até o nosso vizinho que era um chato, passamos a cumprimentar de forma alegre. E para a nossa surpresa, ele responde com simpatia. Talvez nem fosse tão chato assim, era paixão que faltava.
Quando nos apaixonamos apenas destacamos as qualidades do outro. Os defeitos passam despercebidos, podendo ser até considerados como algo engraçado e charmoso.
Quando estamos apaixonados só temos olhos para aquele ser, e o desejo sexual é muito grande. Certamente não haveria divórcios se a paixão fosse constante.
É...porque será que ela acaba? Será que acaba mesmo ou somos nós que acabamos com ela?
Depois de muito pensar sobreo assunto, fiquei imaginando que tudo tem um sentido nesse mundo, a natureza é sábia e deve haver uma razão para que a paixão acabe. E na verdade, como tudo nessa vida ela não acaba, se transforma.
Pensemos no amor como um ser humano e nos ciclos da vida.
A paixão é o início, seria a crianças que quando nasce está atenta a tudo, anseia compreender o mundo, a criança é inocente, feliz por natureza, não se estressa, esquece de comer, enfim é apaixonada pela vida.
O jovem entra em crise, já não sabe mais quem ele é, não é mais criança porém também ainda não é adulto e isso gera uma confusão, então ele precisa de orientação. Seria a fase em que a paixão está começando a se transformar em um amor, mas ainda não está maduro suficiente, podendo correr o risco de perder-se ou jogar-se a aventuras.
Na fase adulta, vem a maturidade, o ser já se conhecer melhor, já se afirmou como indivíduo e sabe o quer. Esse é o amor maduro.
Portanto, respeitando o ciclo natural da vida sei, que não podemos, nem devemos permanecer crianças.
Então o que é necessário realmente é aprender a como transformar nossas paixões em amores maduros. E para isso precisamos antes aprender a transformar nossas crianças em adultos maduros.
Infelizmente ser adulto não é sinônimo de ser maduro. A maturidade vem com as experiências que vivemos e de como tiramos proveito delas. Vem, sobretudo de sabermos aprender com nossos erros e acertos e principalmente observar o mundo ao nosso redor e as pessoas e suas historias de vida. A vida realmente não passa de uma grande escola, basta estar abertos para receber os conhecimentos!